Uma das principais tendências para o mundo do RH é o People Analytics. Como para muitos ainda é uma novidade, esse novo modelo de gestão de pessoas gera muitas dúvidas e questionamentos.
Para desmistificar alguns aspectos dessa metodologia, entrevistamos Mathias Rench, HR da Kraft Heinz. Com dez anos de experiência em recursos humanos, Mathias nos conta suas percepções e experiências com o People Analytics. Confira!
O que as pessoas precisam saber antes de implementar o People Analytics?
Eu acho que todo o processo analítico, People Analytics é um deles, é muito mais uma forma de pensar do que um set de ferramentas. Se você não é curioso o suficiente para ver um KPI e querer entender da onde que ele está vindo, porque que o resultado está bom ou ruim, o que causou aquele número, provavelmente não vai dar certo.
O Analytics em si não só olhar para trás, mas também olhar para frente e tentar prever esse número, tentar prever behavior, tentar prever o que vai causar aquilo… Se a pessoa não tem esse mindset, acho que não adianta entregar a “Ferrari” na mão que não vai sair.
Por onde uma empresa deve começar para a implementação do People Analytics?
O primeiro passo é saber porque ela quer um People Analytics, claramente. Por que você quer isso? Porque os outros estão fazendo, eu acho que isso dificilmente funciona, quando você tenta implementar algo dessa forma. Eu acho que inclusive o Analytics precisa ser direcionado porque analytics não significa nada é uma palavra que se traduz em ser analítico, analisar coisas. Você vai ter que analisar os meios para o fim que você quer chegar.
Então, acho que um primeiro passo para qualquer empresa que queira iniciar o processo, queira criar uma área de People Analytics, melhorar sua análise de dados é saber para que, saber qual o resultado fim que ela está buscando, sem sombra de dúvidas. Acho que depois disso, o processo analítico é muito parecido — tentando simplificar as coisas — com o mindset de curiosidade.
É você olhar para um número e tentar entender o porquê daquele número, da onde ele vem… porque quando você olha para um dashboard passado que está reportando um número, ele vai te mostrar o que aconteceu, mas ele não te mostra o porquê, não te ajuda a entender para frente, o que vai acontecer depois daquilo, não te ajuda a entender o que você deveria fazer para melhorar ou para mudar alguma coisa. E eu acho que essas respostas você só vai conseguir se você for curioso.
Quais as principais barreiras que uma empresa pode enfrentar para finalmente conseguir trazer o People Analytics para dentro?
A principal barreira está dentro do próprio RH, porque eu acho que as áreas de analytics se relacionam bem com as áreas de business que falam mais ou menos a mesma língua. E tem um pouco de dificuldade justamente dentro do RH quando você tem aquele viés da confirmação, você vai buscar o dado simplesmente para provar aquilo que você acredita, ao invés de ser curioso no dado.
Aí tem a ver de novo com a curiosidade, ao invés de você questionar o dado, você começa a buscar só o dado que te interessa. Essa barreira cultural dentro do próprio RH é um desafio gigantesco. Algumas empresas tentam compensar com o approach errado, que é tentar criar uma área de analytics com pessoas analíticas, eu acho que o RH mata essa área.
Você tem que ter uma área de RH analítica e aí sim uma área de People Analytics porque se as pessoas não são analíticas vão tentar manipular os dados, vão trabalhar simplesmente com o que elas acreditam, vão ficar colocando um monte de feeling em cima das coisas.
Então, eu acho que a parte cultural de como o próprio RH se comportou por muitos anos tende a ser a maior barreira de implementação.
Como quebrar essa barreira?
Primeiro você precisa saber o problema que você está buscando resolver, onde você quer chegar, exatamente o que você está investigando e tudo mais. Depois disso, qualquer análise, de qualquer discussão que vai ser feita em cima do assunto, tem que ter um desarmamento no início, vamos partir do princípio que ninguém sabe de nada.
Vamos simplesmente olhar para os dados e tentar entender o porquê daquilo, independente do que você acha a princípio ou do que você acha que deveria ser. Aí começar a construir em cima disso.
Algumas pessoas acreditam que introduzir dados e tecnologia na área de recursos humanos, pode desumanizar a área. Qual sua opinião sobre isso?
No fim das contas a ação que você vai tomar para resolver as coisas, geralmente vai ser uma ação soft, vai ser uma ação people. O negócio de você olhar para o dado é você entender o porquê antes de tomar aquela ação. Se você não entende exatamente o problema que você está tentando resolver e o que está causando aquele problema é muito provável que você vai tomar também a decisão errada, vai acabar não resolvendo.
Já quando você entende qual é o seu problema e o que está causando o seu problema, você pode tomar uma ação soft, uma ação de gente e você vai ser muito mais acurado.
Hoje se fala muito que precisamos de um modelo preditivo de turnover, beleza, então eu vou fazer um modelo preditivo e vou te dar uma lista de 10 pessoas que querem sair da companhia, o que você vai fazer? Aí está o grande desafio do RH. Eu vou te dar o dado, vou te falar quem vai sair, mas aí qual vai ser a ação que você vai tomar?
Mesmo o modelo preditivo ele tem que vir com a ajuda do prescritivo que já sugere uma ação e junto com a ação sempre vai ter que ter uma conversa. O dado pode estar dizendo que o problema é salário, mas em uma conversa você pode descobrir que o probleminha é um pouco diferente. Só com a ajuda de muito processamento para você conseguir pegar no nível do indivíduo e sair um pouco das generalizações.
E como saber se o Analytics realmente dá resultado?
No ano passado a gente teve um número de turnover considerado por nós elevado nos EUA, que foi de 15%. E a gente encontrou um benchmark da mesma indústria de 9%, arredondando os números. E a gente falou, temos que em três anos chegar nesse bench, temos que acompanhar a indústria e não podemos ficar perdendo tanta gente.
E o trabalho que a gente fez para chegar nisso foi de entender os diferentes grupos da companhia. A gente pensou, como é que a gente vai resolver o problema de quatro mil pessoas? Dificilmente você resolve o problema de todo mundo com uma ação simples. Então, a gente separou em grupos. Uma companhia virou 15 grupos diferentes, a gente saiu de 4 mil para cerca de 500 pessoas, uma redução muito grande no tamanho da população.
A partir dessa divisão, encontramos os principais grupos com mais saídas dentro de cada área e nível e fomos conversar com esses colaboradores e buscar compreender qual era o problema. Em cima do problema específico de cada um dos grupos a gente tomou ações. Então, não foi uma ação Kraft Heinz inteira, foram algumas ações localizadas para cada população, para cada grupo menor.
Esses grupos ficaram entre 30 e 40 pessoas. Tínhamos um plano de chegar em três anos nesse número de turnover, em 2020, vamos fechar em algo por volta de 9,5%. Já estamos muito próximos. E aí eu acho que o analytics se justifica porque nós fizemos esse processo de uma forma muito manual, a gente foi pegou os grupos, foi quebrando, foi calculando o turnover do outro grupo e aí foi procurando correlações. Sendo que um analytics mais avançado te dá a correlação.
Por isso que eu digo, é muito mais o mindset do que a ferramenta, então com o mindset a gente fez todo o trabalho no braço e deu muito resultado. Com isso a gente já tem um time de analytics muito maior do que nos anos anteriores porque o trabalho se mostrou eficiente.
Para você qual é o maior potencial do People Analytics em uma organização?
A melhor conexão de um People Analytics, quando você quer ser estratégico, é com performance. Auxiliando a prever e otimizar performance dentro da companhia. Qual o ambiente potencializa a performance? Para cada área da companhia quais são os fatores de motivação desse desempenho? Qual o treinamento que realmente melhora o desempenho do seu time? Eu acho que o analytics conectado à otimização de desempenho é o maior potencial.
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*Crédito imagem destacada: Freepik
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